
Um provável fim...
De súbito meus pensamentos foram cortados pelo chamado que vinha do consultório. A garganta secou. Levantei-me e fui em direção aquela pequena salinha. Olhei novamente para a caneta antes de entrar. Ela parecia mais escura daquele ângulo, talvez fosse preta... Entrei. Sentei. Respirei fundo e então tomei coragem para perguntar ao Doutor o que naturalmente já sabia há tempos: “O que vai acontecer?”. Com a calma e a frieza natural da profissão respondeu-me sem delongas: Você vai esquecer! Vai esquecer tudo daqui um tempo. Um belo dia acordará sem se lembrar de absolutamente nada do que viveu até agora. Minhas pupilas congelaram, o ar me faltou e a minha mente soava algo como um: “Você sempre soube, porque o espanto? Não é a primeira vez...”. Houve uma tentativa de consolo do médico à minha pessoa- uma espécie de compaixão profissional acredito eu- Ele disse: Pense pelo lado bom. Não sofrerá mais, nem mesmo saberá que sofreu por tudo isso um dia, sequer se lembrará que esteve aqui.
Sai. Meus pés me guiaram para algum lugar que não sei dizer, apenas via o corredor do consultório se comprimindo contra mim. Quase não passei por ele. Sentei-me em algo como um banco e pus-me a chorar. Um vento fazia questão de esfriar as quentes lágrimas que me saiam dos olhos para me lembrar que estavam ali em meu rosto. Sofria agora por saber que não mais sofreria. Isso significaria esquecer sem nenhum remorso que um dia fui sua amiga. Esqueceria de tudo sem sofrimento ou dor, sem vestígios de lembrança. Não passaria de estranho colega de classe. Nada mais. Levantei-me, desviei das aves que ali imploravam por migalhas de pão e comecei a andar de volta para a casa.
No caminho pensava naquilo tudo. Percebi que sofria por uma coisa que não me lembraria. Era como matar o que se viveu em vida. “Daqui um tempo nem mesmo saberei que matei algo em mim”. Respirei fundo e aceitei sofrendo. Decidi no momento em que encontrei as chaves no bolso da calça que sofreria até o último dia. Não me lembraria disso mesmo... Com dor tento aproveitar todos os dias enquanto ainda me lembro, mas desejo que o dia do esquecimento chegue logo e leve você, porque sofrer não é algo que esteja na minha lista de coisas legais a se sentir. Você, a situação que se passou e a que se passa me obrigam a isso, não é que eu queira, mas as coisas tem um limite a ser respeitado e os nossos foram totalmente burlados. Repetia a mim: Vai passar! Vai passar. Vai passar... Espero que passe. Tem que passar. Não vai passar. Porque ainda me dói cruzar os corredores. Está sobrando o medo de te encontrar, já que sei que sairei machucada deste encontro.
Poderia até mesmo desejar que uma cicatriz ficasse, mas como sei, nem isso sobrará e é uma pena. Agora só me pego pensando no dia em que, sem nenhuma dor, passarei por você e direi: “oi” sem a menor necessidade de perguntar “como vai você”.
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